Sobre a frase "Não tenho tempo para depressões" - .

10 janeiro 2018

Sobre a frase "Não tenho tempo para depressões"

"Everything will be okay in the end. If it's not okay, it's not the end" (John Lennon)

Sempre que ouço alguém desdenhar dos outros quando os sabem  mais fragilizados a nível de saúde mental,  fico agoniada e inunda-me um arrepio gelado. Não sou de rancores, mas confesso que dificilmente esqueço quem enuncia tal desprezo pela saúde dos outros.

Também não esqueço que eu mesma, na arrogância dos meus trinta e quatro anos, depois de ter tido o Miguel, me gabava de ter tanto trabalho que nem tinha tempo para depressões. Não mordi a língua quando disse a frase, mas deveria tê-lo feito. E com força para que eu aprendesse.

Quis a vida que eu só aprendesse quando me vi inundada de uma tristeza tal que tive também eu de pedir ajuda. Apareceu de mansinho, quando tudo parecia mais calmo, depois de perdas sucessivas que eu parecia ter sido capaz de enfrentar. Escrevia eu que a depressão apareceu quase sem eu dar conta e só o fiz quando me apercebi que, na noite de Natal de há dois anos, eu, sentada à lareira, olhava para os meus filhos, tinha a família unida e tudo para estar feliz e não sentia nada. Mais, só me apetecia que acabasse tudo rapidamente para eu voltar para a cama. Aconteceu o mesmo na festa da passagem de ano (a festa foi cá em casa e eu fui  dormir com os convidados ainda em casa) e numa desejada viagem que fizemos aos Açores. Lembro-me de estar no hotel em Ponta Delgada, sentada em cima da cama, madrugada dentro, a rezar para que o tempo voasse e que eu voltasse para casa. O Luís estava em Angola, os meus filhos só me tinham a mim, eu sentia que não era normal a apatia que me invadia e  pedi ajuda.

Muitas foram as vezes que disfarcei, outras falei nisso de forma leve (como neste post), mas a maioria dos dias eu sentia que agia em modo autómato. Recordo um domingo em que me deitei na cama do Gonçalo, esqueci as refeições dos meus filhos e  dormi o dia inteiro. Profissionalmente, lembro um email que escrevi e que depois me trouxe alguns dissabores e não esqueço a cara de preocupação da D. Conceição quando um dia me perguntou o que se passava com os meus olhos apagados.

Não escrevo este post para que tenham pena de mim. Nada disso. Eu sou uma sortuda: fui ao médico, fiz psicoterapia, tive família e alguns amigos a apoiar (não muitos, porque quando estamos deprimidos não somos grande companhia) e foi passando.

Seis meses depois dei a minha gargalhada com vontade (obrigada Nélia Guarda, Cristina Cunha e Luísa Moreira por aquele dia maravilhoso em Castanheira de Pêra) e lembro que, depois de a dar, estranhei o som...já não me achava capaz de rir assim.

Já passou, mas estou atenta aos sinais e sei que posso voltar a adoecer. Aprendi, por experiência, que ninguém é infalível. 

Para quem está neste momento a lidar com uma depressão, obriguem-se a canalizar energias para algo que gostem de fazer (escrever aqui no blogue e cantar num Coro ajudou-me muito),  não sejam demasiado exigentes convosco e acreditem- vai passar.

Para quem tem neste momento alguém próximo deprimido, recomendo paciência, que apoiem na busca de ajuda profissional,  que NUNCA façam a infeliz pergunta " Mas tu tens tudo...por que raio estás deprimida?" e que acreditem-vai passar.

17 comentários:

  1. As pessoas não compreendem....se fosse um braço partido via se.....mas é a alma....Já passei por isso....e continuo a passar....Só que agora já a reconheço logo de início e sei como me precaver....sofremos e fazemos sofrer quem nos ama de verdade....os outros....são os outros....tudo de bom para si.

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  2. Revejo-me totalmente no que escreveu. Sempre fui forte e toda a gente sempre me considerou forte. Depois de 2 perdas muito importantes para mim, do anúncio do cancro da minha mãe e de conviver quase todos os dias com dores crónicas (sofro de nevralgia do trigémeo), em agosto 2017, comecei a ter graves crises de ansiedade e pânico. Estava com um grave depressão. Estou de baixa e sobre medicação desde dessa altura. Tenho tido uns dias bons mas ainda me sinto tão deprimida, tão "no buraco" que não consigo voltar à minha vida de "antes". à minha volta ninguém percebe, toda a gente acha que estou de férias e ,por isso, devia estar cheia de energia. Quero acreditar que vai passar mas demora....

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    1. Demora, e cada um de nós tem o seu tempo. Beijinhos muito grandes, não se esqueça de si e isso... Acredite que vai passar... A Seu tempo. Obrigada pelo seu comentário e por partilhar❤️

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  3. Muito obrigada pelo seu comentário e, se me permite, um abraço apertado�� Beijinhos

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  4. Obrigada.
    Um beijo no coração.

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  5. Cara Sofia,
    Felizmente não sei do que falas, mas tenho muitas amigas a fazer a mesma travessia no deserto. Não te conhecendo em profundidade diria que o voluntariado pode ser um excelente medicamento, para a alma. Eu tenho tido oportunidade de o fazer em Pedrogão Grande e ajuda-me mais do que eu ajudo.
    Tudo a correr bem e envio daqui muita energia positiva.
    Cristina

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  6. Gostei tanto de ler, da simplicidade, humildade e verdade das palavras! Beijinho grande

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  7. Obrigada por este post.
    CR

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  8. Gostei muito deste post. Eu já estive deprimida e profundamente. Na altura, as pessoas mais próximas de de mim não entendiam porque eu tenha acabado de realizar um sonho: ser mãe. Aliás, o meu marido nunca compreendeu o que era estar deprimido até ao dia em que os acontecimentos da vida lhe deram um murro no estômago e ele também assim ficou. Ainda há, infelizmente, muita ignorância acerca dos problemas de saúde mental.

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    1. Verdade. Depois de sermos mãe é frequente...E também é frequente ninguém entender, não é? Um beijo enorme e obrigada por partilhares a tua experiência.

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  9. Lamento saber que estiveste doente, mas fico muito feliz que tenhas ultrapassado esses maus tempos :)
    Felizmente nunca a passei por isso é oxalá nunca passe porque sei que é muito difícil...

    Beijinho
    Carla

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  10. Chegou cá, Cristina.
    Já faço voluntariado (menos do que gostava). E sim, também tem sido /é uma boa ajuda.
    Beijinhos

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  11. Beijinhos, Joana Oliveira. E obrigada.

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